quinta-feira, 9 de maio de 2013

Jornalistas, profissionais e diplomados

Enquanto fim da obrigatoriedade do diploma tramina no Tribunal Federal, jornalistas buscam reconhecimento da importância da formação superior
Por Manoela Nascimento

Karam: ética se aprende na escola, sim
Na era das mídias digitais e das grandes mudanças no processo de transmissão e reprodução de informações, o futuro da profissão jornalística nunca foi tão discutido. O cenário do debate coloca em questão a contribuição que o curso superior pode trazer ao profissional, e até que ponto a exigência do diploma vai de encontro à constituição, que por sua vez, garante a liberdade de manifestação do pensamento, a liberdade de expressão intelectual, artística e científica de todos os indivíduos.

A obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista ainda tramita no Supremo Tribunal Federal, com propostas de emenda à Constituição. A FENAJ (Federação Nacional dos Jornalistas) vem promovendo o debate sobre a medida com o intuito de reforçar os argumentos quanto à importância da formação superior. Após liminar concedida em 2001 extinguindo a obrigatoriedade do diploma, a Federação reuniu artigos de profissionais da área no livro Formação Superior em Jornalismo: Uma exigência que interessa a Sociedade, com supervisão editorial do professor da Universidade Federal de Santa Catarina, Francisco José Castilhos Karam.

Doutor na área de deontologia e ética em jornalismo, Karam reforça os argumentos favoráveis à formação acadêmica, que são encontrados em seus artigos e livros. Em palestra aos alunos da Universidade do Sul de Santa Catarina no dia 20 de abril, o jornalista afirmou: “Hoje a formação acaba sendo muito importante porque nela temos as bases éticas, técnicas e estéticas fundamentadas em uma teoria para o exercício profissional em diferentes plataformas. Nela estudamos os padrões obviamente consolidados e os novos padrões que estão se configurando.”

Atualmente os cursos de jornalismo nas faculdades têm a duração de oito semestres que concentram a formação básica para que o futuro profissional trabalhe em meios de comunicação. Além das práticas com textos, fotos e outros suportes jornalísticos, os alunos são apresentados aos princípios éticos da profissão. Em meio ao debate, a plateia questionou se a ética pode ser vista como uma qualidade que vem de berço ou um valor agregado, que pode ser ensinado em uma sala de aula. Quanto a essa questão, o professor Karam responde: - Nascemos éticos ou não? É uma questão que ouvimos. Não existe uma ética no jornalismo porque a pessoa ou nasce ética ou não nasce ética. No limite, isso leva ao que o jornalista Paulo Santana falou: já que querem diminuir a criminalidade infantil, minha sugestão é que algemem todos os bebês quando nascem, depois a gente vai soltando aos poucos, pra ver quem é bom ou não. 

A questão da ética o que é? A pessoa nasce; mas a pessoa é um processo, depende da família, da educação, da convivência ao redor de determinados valores sociais que devem ser mantidos, alguns superados, fortalecidos; por exemplo, prezar a convivência, a solidariedade, ser contra a tortura. Tudo isso está muito no centro da questão ética, mas é um processo usufruto do passado em relação a como se vai produzir o presente e o futuro desde o nascimento. Então é uma questão de formação que vai entrar na formação específica para os procedimentos da atividade jornalística. Nesse caso, o profissional vai trabalhar num mercado que pode ser de um jornal, de um conglomerado, ou de uma assessoria, mas existem alguns valores básicos e universais que precisam ser conhecidos e respeitados.

Para entender o contexto da decisão judicial

A primeira escola de Jornalismo no Brasil foi a Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero, fundada em 1947, em São Paulo. Na década de 60 foram sendo criados cursos de jornalismo em outras instituições. Em 1969, o país vivia em regime ditatorial militar, sem liberdade de expressão, com o governo submetendo os meios de comunicação a um forte controle pela censura. Nesse contexto político é que a obrigatoriedade do diploma para exercício da profissão de jornalista foi instituída em forma de decreto-Lei. Após retomada a democracia, o decreto ainda encontrava-se em vigor.

Em outubro de 2001, a juíza substituta da 16ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo, Carla Abrantkoski Rister, concedeu liminar ao processo de iniciativa procurador da República, André de Carvalho Ramos do Ministério Público Federal, acabando com a exigência de formação superior em jornalismo para o exercício da profissão.

A decisão da juíza fundamentou-se no argumento de que o jornalista deve apresentar formação cultural sólida e diversificada, o que não se adquire apenas com a frequência a uma faculdade, e sim pelo hábito de leitura e pelo próprio exercício da prática profissional. Em um trecho de seu parecer final, a juíza Carla Abrantkoski Rister afirma: “Há escolas de jornalismo, mas a passagem por uma delas não é requerida para se adentrar na profissão. Essa total liberdade de recrutamento tem os seus aspectos positivos, sendo que o aprendizado pela prática atende bem as peculiaridades da profissão. A despeito disso, é mesmo paradoxal que uma atividade que confere um poder excepcional sobre o conjunto da opinião pública seja subtraída da verificação de qualidade daqueles que a exercem.”

 Profissionais da área que se apresentam favoráveis ao exercício qualificado através de formação acadêmica, por sua vez, conferem ao curso superior o papel de aprofundar e agregar qualidades inerentes à atividade. Isso ganha maior peso quando se considera que o jornalista, como afirma a própria juíza Carla Abrantkoski Rister, exerce um poder excepcional sobre o conjunto da opinião pública.

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