quarta-feira, 8 de maio de 2013

Ética, polêmica e paixão no jornalismo

Especialista em ética jornalística, Francisco Karam, discute a lei que reabre a polêmica envolvendo exigência do diploma jornalístico
Por Mariana Smânia

Aprovada em plenário pelo Senado, a nova lei que obriga a exigência do diploma para o exercício do jornalismo apenas aguarda a próxima etapa para entrar em vigor. O autor da proposta, Antônio Carlos Valladares, diz ter sido motivado pelo que consta na Constituição: “Todas as profissões são regulamentadas pelo Poder Legislativo. A profissão de jornalista exige um estudo científico, que se aprende na universidade. Não é justo que um economista diga: meu diploma vai valer, o seu não vai”. Apesar disso, o relator do processo e presidente do STF, Gilmar Mendes, levanta um argumento válido tanto para quem é a favor do diploma, quanto para quem é contra: "A formação específica em cursos de jornalismo não é meio idôneo para evitar eventuais riscos à coletividade ou danos a terceiros”.

Em palestra aos estudantes de jornalismo da Unisul no dia 20 de abril, o pesquisador Francisco José Castilhos Karam defende uma formação específica em jornalismo que dê bases éticas, estéticas e técnicas para exercer a profissão, mas enfatiza que o profissional precisa dar continuidade aos estudos da área, procurando sempre respeitar todas as barreiras impostas pelos direitos do cidadão, por mais maleáveis que elas sejam. Jornalista e professor do mestrado na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Francisco Karam é autor dos livros “Jornalismo, Ética e Liberdade”(1997) e “A ética jornalística e o interesse público”(2004). Mestre pela Universidade de São Paulo (USP), doutor pela PUC-SP, realizou seu Pós-Doutorado na Universidade de Quilmes, na Argentina.

Exemplificando casos marcados pela falta de ética, Karam cita o editor da “má língua”: “Um jornalista, agora professor-doutor da Universidade de São Paulo, começou a trabalhar em uma dessas revistas populares. Na falta de notícia, o editor pediu-lhe para publicar que as más línguas disseram ter visto Cláudia Raia acompanhada num restaurante noturno. Na época, a atriz era casada com o Edson Celulari. O jornalista respondeu que a única má língua que via por ali era a do editor”.

Pode parecer um exemplo fora do normal, mas situações de manipulação da notícia, e mesmo de mentira, como é o caso, acontecem, e muito, segundo o pesquisador de ética jornalística. O (agora) professor foi demitido na época, mas quais não seriam as consequências para a atriz se, não deixando sua ética falar mais alto, o professor tivesse publicado a notícia falsa? São casos assim que inspiram a discussão sobre a exigência ou não do diploma jornalístico.

Existem dois tipos de jornalistas: o "jornalista por formação” e o “jornalista por vocação”, na concepção de Bernardo Kucinski, jornalista e escritor autodidata citado por Karam. Graduado em física pela USP, tornou-se jornalista na época da ditadura no Brasil. Defendendo a necessidade da paixão no jornalista, Kucinski critica a forma como o ensino superior na área é ministrado hoje. "Antigamente o jornalismo era uma opção de quem gostava muito de escrever, ler e sentia necessidade de comunicar aos outros suas opiniões, críticas e posições políticas", declarou, em uma entrevista ao USP Online. Hoje, diz ele ainda, há centenas de faculdades que oferecem o curso, mas nem todas têm a "formação política e filosófica que seria necessária para um jornalista.”

O físico começou a atuar na área jornalística durante a Ditadura Militar, quando a liberdade de expressão foi condenada e o jornalista autodidata ganhou força. É nesta época, inclusive, que o governo cria a lei da exigência do diploma na profissão. Tanto os que aprovam a exigência, quanto os que a desaprovam concordam com o argumento de que a razão da lei foi o interesse do governo militar em exercer um maior controle sobre o que estava sendo veiculado para a população, o que claramente não deu muito certo. Porém, como tudo tem seu lado positivo, o que antes era lei por motivos repressivos, hoje se tornou indispensável para a veiculação de informação de qualidade e de uma forma ética e democrática à população, segundo à FENAJ (Federação Nacional dos Jornalistas).

Em meio a essa polêmica sobre exigir ou não a formação acadêmica, diplomados, não diplomados, acadêmicos e autodidatas permanecem esperando a decisão, mas nunca deixando a curiosidade, o estudo, a ética e a paixão de lado.

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